
"All these tapes in my head swirl around
Keeping my vibe down
All these thoughts in my head aren't my own
Wreaking havoc"
-Tapes. Alanis Morissette.
Falávamos sobre como muitas coisas haviam mudado. Mais que isso: a velocidade com que tudo havia mudado. Algo nesse dia nos fez lembrar de como as coisas eram, e de como elas nos serviam.
A música que ouvíamos saia de um toca-fitas; era de qualidade inferior. Mas as fitas guardavam em si mesmas tudo que queríamos ouvir... era passando uma música por cima da outra, sem o mínimo de dó das que não aquentávamos mais ouvir. O passado era apagado, e praticamente irrecuperável. Quando havia algum valor, pelo mínimo que fosse, era preciso pensar muito antes de abandonar aquela letra de difícil acesso. Letra que possivelmente fora tirada do rádio, letra que perdemos o início, porque não chegamos a tempo, letra que era marcada com um "TAP" no início e outro no final...letra muito, mas muito delineada em seus significados.
Tudo que passamos tem sido diferente do que foi um dia. Somos os mesmos, mas um pouco mais doces e um pouco mais bárbaros. Não precisamos mais pensar tanto sobre o que tem relevância, apenas vivemos conforme o que já havíamos ditado. Nos sentimos mais frágeis, porque não temos mais fitas para passar por cima as coisas que já não são mais tão boas de se ouvir. Já não pensamos mais sobre tudo ao nosso redor, nem em como selecionar as mais importantes para ouvir. Hoje temos a capacidade de armazenar tudo. Crescemos e aumentamos nossos "bits" de memória para as coisas do mundo. São tantas coisas, e mesmo assim sabemos de todas elas, ouvimos todas elas e nunca as apagamos... o que nos livra da culpa e da injustiça de apagar o que não nos serve... mas também não nos obriga a delinear bem a música que está tocando, a que nos movimenta, nos impulsiona. Na verdade, deixamos de ser tão seletivos. E as coisas deixam de ser tão raras... as letras já não são tão importantes, porque elas podem ser recuperadas. Elas também são todas iguais, porque já não há "TAPs" que as individualizem e nos deixem felizes por termos conseguidos mais ou menos da música que acabou de começar no rádio. Todas são completas nos nossos novos aparelhos eletrônicos.
Assim são todas as pessoas que nos preenchem igualmente, que não têm cicatrizes que determinem onde elas começam e onde elas terminam para a gente. Elas apenas estão lá, e sempre que precisam ser repetidas, as buscamos com uma certa dificuldade em uma grande pasta de dados. Quando guardávamos nossas músicas em nossas fitas, sabíamos o local exato onde a música estava. Rodávamos um pouco para frente, um pouco para traz... mas enfim as achávamos. Errávamos duas ou três vezes, mas não mais que isso. Sabíamos que estavam ali. E dependiam apenas da gente para que continuassem ou não sendo tocadas. Era a dificuldade de achá-las no rádio que as faziam tão especiais. E, acima de tudo, eram seus defeitos, seus "TAPs", que as deixavam com nossa cara. Eram suas digitais. Nenhuma música em nossa fita era igual a mesma música na fita de outra pessoa. Era isso que nos deixava mais íntimos delas, pois só nós sabíamos como ouvi-las e onde achá-las. Ninguém mais saberia fazer isso. E assim são nossas pessoa de hoje, que aos poucos têm mudado, têm se tornado iguais e já não demarcam tanto seus espaços.
Falávamos sobre como muitas coisas haviam mudado. Algo nesse dia nos fez lembrar de como as coisas eram, e de como elas nos serviam. Algo que ainda temos, pessoas que tocam em minha cabeça, pessoas que não podem ser apagadas, porque só tocaram uma única vez no rádio. Pessoas que possuem um bom começo e um bom fim...bem delineadas, incompletas e, sobretudo, únicas.